quinta-feira, 27 de outubro de 2022

O GUARDA

 

Era tarde de domingo, momento em que eu desfrutava as últimas horas de ócio do fim de semana, quando a campainha tocou com insistência. Atendi, mas antes que eu pudesse dizer alô! Ouvi uma voz alegre do outro lado da linha a me desejar boa noite. Sorri, pois já havia identificado o sotaque inconfundível do Toninho, um guarda de quarteirão que há algum tempo se tornou meu amigo de prosa. Amizade esta que começou quando ele apareceu no portão da minha casa pela primeira vez e se identificou como vigilante noturno da redondeza desejando-me um Feliz Natal! Muito simpático e bom de proza discorreu sobre vários assuntos ao mesmo tempo, desde o cotidiano de sua profissão até pormenores da vida particular e familiar. Confesso que fiquei confuso e por alguns instantes o meu consciente divagou sobre as pretensões daquele sujeito.  A minha reação foi a de buscar uma solução imediata para me livrar do tal imprevisto. Perguntei o quanto eu tinha de pagar de mensalidade para ele me colocar no rol da sua freguesia. Com um olhar acanhado e meio sem jeito respondeu: Não! O senhor não tem que pagar nada, na realidade eu não posso atuar nesta sua rua, sou de outro setor que começa na esquina de baixo. Eu só quero dizer que apesar de não ser deste setor eu sempre estou de olho na sua casa, pois passo aqui em frente varias vezes a noite. Só passei aqui mesmo para desejar um feliz natal (realmente já era época natalina) e dizer que estou à disposição caso o senhor viaje ou precise de algum serviço. Foi o suficiente para eu tirar a carteira do bolso e lhe dar um agrado financeiro. Percebi que o seu semblante mudou. A partir daí, o Toninho nunca mais me esqueceu, seja no Natal, na Páscoa ou em outros momentos que ele acha que eu mereça sua visita. Sempre o convido a entrar para uma água e um cafezinho, ás vezes aceita, outras agradece e recusa na justificativa de que não pode ausentar-se do seu posto de serviço.  Confesso que me surpreendi com a última visita que ele me fez, afinal não era nenhuma data específica que costumeiramente se torna motivo para sua visita, quando abri o portão ele estava com uma sacolinha de plástico com alguns limões para me oferecer. Disse que havia colhido no quintal da casa de sua mãe onde os frutos haviam produzido em abundância, então havia se lembrado de mim. Numa dessas datas que antecedeu o domingo de Páscoa tive a oportunidade de retribuí-lo mais uma vez com alguns mimos em agradecimento aos relevantes serviços que, segundo ele, me presta de forma voluntária durante o ano. Confesso que embora não o tenha visto passar em frente a minha casa, ouço o silvo de seu apito nas quadras adjacentes com um soado distante que desperta o meu sono.

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